quarta-feira, 2 de setembro de 2009
Be Kind Rewind...
Às vezes desejo secretamente que a vida devia se configurar como um DVD, de forma que, quando completássemos dezoito anos, ganhássemos como prova da idade um controle remoto com lindos botões rewind and forward, nos dando a abertura de transitar por todos os nossos anos, rememorando a melhor loucura e nos arriscando a descobrir o nosso leito de morte. Talvez o excesso de viagens para frente e para trás, além de nos causar o enjôo típico da incerteza, além de nos confundir as emoções e de nos tornar existencialmente atemporais, terminaria se solidificando enquanto um longo tédio rotineiro e firmando permanentemente a resolução do porquê vivemos no, e devemos ao, presente. Não me parece ser por acaso. Ainda assim, fico com um sorriso distante só de pensar na possibilidade de acelerar a dor – sentindo-a mais intensamente numa durabilidade menor; na praticidade de mudar o ângulo de visão, brincar com o zoom – entendendo os pontos-de-vista que nos escapam, os contextos que não nos pertencem, as distâncias e aproximações. Parece um vício dos bons: pensem no prazer quadro a quadro – descobrindo a alegria de cada segundo, resgatando um sentido a cada gesto; na vontade sincera e justa de pular capítulos inteiros, pausar momentos de dúvida extrema, viver o mesmo frio na espinha uma centena de vezes. A velhice me parece ser a superação deste desejo: desejo de quem carrega uma juventude amada que começa a pesar e desejo de quem olha para frente sem olhos de farol. Por ora, na encruzilhada dos vinte e poucos anos, bem que a vida poderia ser cheia de funções técnico-afetivas, nem que fosse uma breve alienação de nós a nós mesmos, de nós em nós mesmos, afinal, a única função de DVD que nos resta enquanto seres humanos donos de nosso destino e condicionados por nossa realidade é a do botão eject. Nada mais. Ao menos, os anos têm passado, vinte seis deles, e o único botão do controle tem se mantido intacto. Deve ser o sinal de alguma fé na humanidade. Quem diria.
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